O desenvolvimento da sociologia no Brasil é dividido em quatro períodos pela maioria dos estudiosos do assunto. O sociólogo e filósofo Nildo Viana, em seu livro Introdução à Sociologia (2006), estabelece os quatro períodos da seguinte maneira:
1) Do final do século XIX até a déc
ada de 1930, a fase de elaboração;
2) De 1930 até 1945, o início da institucionalização;
3) O período da consolidação, que se inicia a partir de 1945; e
4) O pleno desenvolvimento da ciência, com aprofundamento dos temas e que se inicia aproximadamente entre os fins dos anos 1950 e início dos anos 1960.
A seguir descreveremos em mais detalhes as características de cada um destes períodos.
1) A fase de elaboração:
O primeiro período, o período de elaboração da sociologia brasileira segundo Viana, representa uma fase em que o Brasil e a América Latina como um todo não tinham produção original na área de sociologia. Liedke Filho se refere a este período como “O período dos pensadores sociais”, caracterizando-o como uma fase pioneira. O pensamento sociológico desta fase da história é produzido por intelectuais e políticos, influenciados pelo pensamento sociológico europeu e americano. Baseados em correntes de pensamento como o iluminismo, o positivismo de Comte, o evolucionismo de Spencer e Haeckel e o determinismo biológico de Lombroso, entre outras linhas de pensamento, autores brasileiros tentavam encontrar explicações para os problemas nacionais da época. A oposição entre liberais os e autoritários e a questão da identidade nacional, tendo como aspecto principal a questão racial, eram alguns dos principais temas que ocupavam o debate sociológico da época.
Também são neste período que se realizam estudos de antropologia física e cultural no Brasil, geralmente por missões conduzidas por estrangeiros em viagem pelo país. Influenciados por tais iniciativas autores brasileiros, como Nina Rodrigues e Roquette Pinto, também efetuaram estudos antropológicos, produzindo vasto material sobre a cultura dos negros de Salvador e a organização social indígena. O sociólogo Fernando de Azevedo (1884-1974) avaliou a interação entre as teorias sociais europeias e os estudos antropológicos realizados por brasileiros, como muito importantes para o posterior desenvolvimento da moderna sociologia brasileira.
Fhttps://youtu.be/j8s9Hb2k3Kglorestan Fernandes, citado por Liedke Filho, divide este primeiro período de elaboração da sociologia no Brasil em duas fases. Uma primeira, que ele chamou de “período de autodidatismo”, e que principia no terceiro quartel do século XIX, quando se desagrega a ordem social escravocrata e se iniciam os primeiros estudos sociais. Os temas abordados nestes trabalhos são, por exemplo, a conexão entre o Direito e a Sociologia, a Literatura e as condições sociais, e o Estado e a organização social. A segunda fase tem início no princípio de século XX, quando a sociologia se desenvolve
“tanto sob a forma de análise histórico-geográfica como sociológica do presente, quanto sob a inspiração de um modelo mais complexo de análise histórico-pragmática, em que a interpretação do presente se associa a disposições de intervenção racional no processo social (Fernandes apud Liedke Filho: 2005, p. 380).
Segundo a interpretação de Liedke Filho deste período de desenvolvimento da sociologia, cabe aqui ainda incluir a fase chamada de “sociologia de cátedra”, quando a disciplina foi incluída nos cursos de filosofia, direito e economia. Na década de 1920 a sociologia também passa a ser ministrada nas escolas normais. Foi durante este período que se multiplicaram as publicações de manuais, que divulgavam as idéias dos cientistas europeus e americanos. Também foi nesta fase histórica em que se discutiram as idéias sociológicas a respeito de problemas que afetavam diretamente a sociedade da época, como os temas da urbanização, da migração, do analfabetismo e a pobreza.
Diversos fatores propiciaram o desenvolvimento da sociologia neste período. As migrações internas, as diferentes culturas (incluindo os imigrantes), as variadas realidades sociais. Estes aspectos, associados aos movimentos que cercaram a revolução de 1930 nas letras, artes e política, foram importantes na consolidação da sociologia. No entanto, o principal fator impulsionador foi o início da industrialização e a urbanização. Escreve em relação a este ponto o sociólogo Fernando de Azevedo:
“... [o] que nos compeliu a essa revolução intelectual, que nos iniciou no espírito crítico e experimental, em todos os domínios, e nos abriu o caminho aos estudos e as pesquisas sociológicas, foi, no entanto, o desenvolvimento da indústria e do comércio nos grandes centros do país e, particularmente em São Paulo e no Rio de Janeiro” (Azevedo apud Liedke Filho: 2005, p. 381).
2) A institucionalização:
O período da institucionalização da sociologia corresponde à fase do aparecimento da “sociologia científica”, que baseada no paradigma estrutural-funcionalista, procurava dar ao ensino e à pesquisa sociológica o mesmo nível dos países europeus e Estados Unidos. Foi em 1930 que ocorre a criação da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (1933) e da Seção de Sociologia e Ciência Política da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (1934). Esta última, influenciada pelo pensamento da Escola de Chicago, representada pelo professor Donald Pierson, realizou uma série de estudos de comunidade, que hoje podem ser consideradas as primeiras pesquisas sociológicas do Brasil, tratando da transição da sociedade tradicional para a moderna.
Importante aspecto nos estudos sociológicos deste período foi a vinda de diversos intelectuais para lecionarem na Universidade de São Paulo. Jacques Lambert, Levi-Strauss e Roger Bastide – este último mestre de Florestan Fernandes – foram figuras importantes na consolidação da ciência no país. A publicação das obras de Caio Prado Júnior (Formação do Brasil Contemporâneo,1942 e História Econômica do Brasil, 1945) e de Gilberto Freyre (Casa Grande e Senzala, 1933 e Sobrados e Mucambos, 1936) também tiveram influência importante no desenvolvimento dos estudos sociológicos. Sobre este período escreve Florestan Fernandes que a preocupação dominante era
“de subordinar o labor intelectual, no estudo dos fenômenos sociais, aos padrões de trabalho científico sistemático. Esta intenção se revela tanto nas obras de investigação empírico-indutivas (de reconstrução histórica ou de campo), quanto nos ensaios de sistematização teórica (Fernandes apud Liedke Filho).
3) A consolidação
O terceiro momento de formação da sociologia, segundo Viana, tem início em 1945. Esta fase representa a consolidação desta ciência no país. Apesar de se utilizarem ainda parâmetros e referenciais europeus, é neste período que a sociologia brasileira começa a desenvolver sua originalidade. Sob o ponto de vista político, o país atravessava uma fase de redemocratização com a renúncia de Vargas, que se estenderia somente até 1947, quando o então presidente Dutra toma uma série de medidas antidemocráticas.
projetos de pesquisa sobre temas como as relações raciais no Brasil, a empresa industrial em São Paulo e o desenvolvimento brasileiro. Grande influência no pensamento sociológico do período foi o pensamento de Karl Marx.Por volta de 1954 organiza-se um grupo de sociólogos, chamado de “Escola de Sociologia Paulista” ou “Escola da USP”, sob a liderança do sociólogo Florestan Fernandes. Este grupo desenvolveu diversos O período da institucionalização da sociologia corresponde à Um dos paradigmas sociológicos da época foi a “Teoria da Modernização”, que concebia o processo de desenvolvimento da sociedade brasileira como uma transição de uma sociedade rural tradicional para uma sociedade industrial moderna. Não sendo completa esta transição, existe a convivência destes dois tipos de sociedade, formando então o que se convencionou chamar de “sociedade dual”. Algumas das características desta dualidade contrapunham aspectos como: sociedade tradicional e sociedade moderna; rural e urbano-industrial; estagnada e dinâmica; iletrada e letrada; religiosa e secularizada, etc. Segundo Liedke Filho,
“Esperar-se-ia que um patamar superior de modernização societária, caracterizada pela evolução para uma “sociedade racional, democrática e urbano-industrial” levaria à institucionalização plena da “Sociologia Científica”, típica da terceira etapa de evolução da sociologia na América Latina. Esta abordagem sustenta, portanto, uma estreita associação entre modernidade, democratização e condições favoráveis à evolução da sociologia.” (Liedke: 2005, p. 389).
Uma das grandes preocupações na sociologia deste período é fugir do sincretismo, dogmatismo, dedutivismo, alienação e inautenticidade, características de uma sociologia “enlatada”, “consular”. Este tipo de sociologia continuava sendo uma simples cópia ou
adaptação daquela praticada na Europa e nos Estados Unidos.
4) O pleno desenvolvimento:
A quarta fase de desenvolvimento da sociologia se dá em um ambiente de pleno desenvolvimento da industrialização no país e em meio a um grande processo de migração interna, do campo para a cidade e das regiões rurais para as industrializadas. Politicamente o país vivia uma democracia sujeita a todas as pressões de grupos conservadores e antipopulares, que temiam uma tomada do poder pelas forças democráticas de tendência socialista – fato que acabou precipitando o Golpe de 1964. Durante a década de 1960 e início dos anos 1970 o número de cursos de graduação e pós-graduação aumentaram. No ramo da pesquisa sociológica aumentava a preocupação com os temas contemporâneos, como o modelo econômico excludente e autoritário, os movimentos urbanos e rurais, o novo modelo sindical, a questão política no âmbito da Teoria da Dependência.
Grande expoente da sociologia neste período foi o sociólogo Florestan Fernandes. Ingressou na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo em 1941, onde depois da saída de Roger Bastide assume a cadeira de Sociologia I. Dentre seus principais colaboradores encontravam-se sociólogos que posteriormente formariam a elite desta ciência no Brasil: Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni e Renato Moreira Jardim. Este grupo, atuando na Faculdade de Filosofia da USP dedicou-se à pesquisa de temas que seriam referência no desenvolvimento posterior da sociologia.
Atualmente a sociologia brasileira procura uma nova identidade. Os estudos relacionados à dependência econômica, característica da primeira metade da década de 1970, foram seguidos por pesquisas relacionadas com a temática da sociedade civil, que se transformou em temáticas dos movimentos sociais e da redemocratização. Em sua transição da década de 1970 para a década de 1990, os interesses da sociologia se tornaram bastante amplos, abrangendo várias áreas de conhecimento. Segundo Liedke Filho, o diretório de grupos de pesquisa do CNPq tinha as seguintes linhas de pesquisa:
sociologia, 181 linhas; sociologia do conhecimento, 60 linhas; sociologia urbana, 59; sociologia rural, 57; sociologia do desenvolvimento 50; fundamentos da sociologia, 39; sociologia da saúde, 23; e outras sociologias específicas, 233.
As influências atuais do exterior são bastante diferentes das de outros períodos. Nos últimos anos os estudos sociológicos mostraram grande influência de pensadores como Bourdieu, Foucault, Giddens, Elias e Habermas, além da releitura das obras de Weber. Os estudos sociológicos ganham em abrangência e diversidade de temas e espera-se que mesmo assim, a produção acadêmica possa gerar estudos que tenham relevância e despertem o interesse da sociedade.
Espero que tudo isso ajude vcs.
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