sexta-feira, 13 de maio de 2011

A vida dos negros depois da abolição.

O 13 de maio é mesmo uma data a ser comemorada?


Em 13 de maio de 2008, comemoram-se os 120 anos da assinatura da lei Áurea pela princesa Isabel, que ocupava então a Regência do Império do Brasil, em virtude de um tratamento de saúde que seu pai, o imperador dom Pedro 2º, realizava na Europa.

História

A data está um pouco desprestigiada desde a década de 1970, quando os movimentos negros brasileiros resolveram instituir um dia da consciência negra para ressaltar o papel dos próprios negros no processo de sua emancipação. Assim, o dia 20 de novembro, que relembra a execução de Zumbi, seria um contraponto ao 13 de maio.

De acordo com essa perspectiva, o 13 de maio seria uma data que representaria a abolição como um ato de "generosidade" da elite branca e transformaria a princesa na personagem principal da libertação dos escravos. Ao contrário, o 20 de novembro, homenageando Zumbi e o quilombo de Palmares, seria um símbolo da resistência e da combatividade dos negros, que, de fato, não aceitaram passivamente a escravidão.

Aos poucos, o dia nacional da consciência negra ganhou prestígio, até ser incluído no calendário escolar brasileiro, pelo artigo 79-B, da lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que incluiu no currículo escolar a obrigatoriedade da temática "história e cultura afro-brasileira". Tornou-se também, segundo a Agência Brasil, um feriado em 225 municípios brasileiros, inclusive São Paulo, a maior metrópole do país.

Comemorar o 13 de maio
A questão que se pode levantar a partir disso é: há ou não motivos para a comemoração do 13 de maio? A efeméride tem, sim, seu valor histórico. Ela comemora a vitória do movimento abolicionista e do parlamento brasileiro. A campanha abolicionista, um dos maiores movimentos cívicos da história do Brasil, ao lado da campanha pelas Diretas Já, atingiu o êxito no exato momento que a princesa Isabel assinou a célebre lei.

Por outro lado, é importante ter em mente que a história trata de fatos do passado, mas as interpretações desses fatos dependem da época em que elas são feitas. O significado dos fatos, portanto, varia de acordo com as gerações de historiadores que se debruçam sobre eles e, também, segundo a ideologia que está por trás de suas interpretações.

Assim, o que se valoriza numa determinada época, pode simplesmente ser considerado menos importante ou até se pôr de lado numa ocasião posterior. Um outro exemplo da história ajuda a esclarecer a questão: a comemoração de 21 de abril, que relembra o martírio de Tiradentes só passou a existir após a Independência do Brasil. Enquanto éramos colônia portuguesa, Tiradentes não era considerado um herói, muito pelo contrário.

Depois da abolição
Enfim, a lei Áurea serviu para libertar 700 mil escravos que ainda existiam no Brasil em 1888 e proibir a escravidão no país. Independentemente disso, não se pode deixar de reconhecer que a abolição não resolveu diversas questões essenciais acerca da inclusão dos negros libertos na sociedade brasileira. Depois da lei Áurea, o Estado brasileiro não tomou medidas que favorecessem sua integração social, abandonando-os à própria sorte.

Essa dívida social, porém, não pode ser imputada somente à princesa Isabel e à monarquia. A situação social dos negros não melhorou com a República. Sobre isso, o Estado só veio a se pronunciar com mais veemência no ano 2003, com a instituição da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que tem desenvolvido projetos visando a inclusão social do negro.

Apesar disso, as estatísticas do IBGE ainda registram grande desigualdade em relação a negros e brancos. Alguns exemplos referentes à educação são bastante significativos. Os dados mais recentes apontam a taxa de analfabetismo das pessoas com 15 anos de idade ou mais: 8,3% de brancos e 21% de negros.

A média de anos de estudo das pessoas com 10 anos de idade ou mais é de quase seis anos para os brancos e cerca de três e meio para negros. Enquanto 22,7% dos brancos com 18 anos ou mais concluíram o ensino médio, somente o fizeram 13% dos negros.

Brasil Império
A Abolição da Escravidão

13 de Maio: A Revolução Social Brasileira

Por Henrique Cunha Júnior *

13 de maio tem sido uma data pouco comemorada e pouco analisada no calendário nacional e escolar. Já foi feriado nacional e depois deixou de ser. Mas deveria ser uma reivindicação da população que datas como 13 de maio e 20 de novembro fossem cercadas por grandes manifestações, que tivéssemos na escola e na sociedade um símbolo importante marcado por estas datas para refletirmos sobre a realidade brasileira, sobre a nossa história e sobre as conquistas populares. Em todos os países da América onde houve escravismo recente, a data da abolição é comemorada com grandes festas, muitos discursos e uma ampla revisão histórica. Aqui no Brasil, pelo contrário, se quer fazer esquecer o 13 de maio, pois uma parte da sociedade não quer ser considerada culpada pela criminalidade do escravismo, enquanto outra parte perdeu o referencial do que o 13 de maio representa para as lutas do povo brasileiro.
O primeiro fato importante que tem sido omitido da população brasileira sobre o 13 de maio - me é daí que leva a não darmos importância a ele -, é o que permite uma parcela da população fazer de conta que não tem importância o escravismo e o quanto foi criminoso. Por outro lado, o 13 de maio tem sido omitido enquanto resultado de um longo processo de lutas do negro brasileiro e da população consciente contra o regime criminoso do escravismo.

O Escravismo foi Crime Contra a Humanidade

A maioria das pessoas tem vergonha de dizer que são descendentes de escravizados. Isto porque existem informações errôneas e antiéticas sobre a história brasileira. Se tivéssemos a informação correta, moral e ética, diríamos que o escravismo foi um regime criminoso contra a humanidade, de leis e fatos, imorais, antiéticos, condenáveis em qualquer sociedade que fizesse bom juízo dos fatos. Quem deveria ter vergonha, pois roubou e matou, viveram na continuidade dos benefícios do roubo.
Algumas pessoas vão erradamente argumentar: mas era lei da época. Não justifica. Vejamos como comparação o que ocorreu durante o nazismo na Alemanha. As leis da época do nazismo permitiam a prisão e o massacre dos judeus. Passado o nazismo, todos que governaram e se beneficiaram do regime foram julgados e condenados. Tinham estabelecido lei de estado criminosos que atentavam contra a humanidade. Portanto, crime é crime, com lei ou sem lei que os proteja. Assim deveria ter ocorrido com o escravismo. Atualmente, apenas a Igreja Católica, através do Papa admitiu o erro, demonstrou ter vergonha do erro, do regime. Deveria ser referencial para começar a discutir o 13 de maio.
O enfoque sobre o escravismo como crime contra a humanidade, leva a uma possibilidade de discutir melhor o 13 de maio, como ele foi e não como é pensado agora. O 13 de maio é o fim da criminalidade praticada pelo estado brasileiro e por todos aqueles que se beneficiavam vergonhosamente do trabalho roubado da população negra.
Mas o que realmente ocorreu no 13 de maio?

Onda Negra Medo Branco

Azevedo (1987)¹ elucida parte do que provocou assinatura da abolição do escravismo em 13 de maio de 1888. Primeiro, boas parte da população africana e Afro-descendente que vivia no Brasil já tinha conseguido reconstituir a liberdade perdida por diversas formas de luta contra o escravismo. Entretanto, no 13 de maio 700.000 pessoas que ainda eram mantidas injusta e criminosamente no regime de cativo readquirem a liberdade. Esta é, portanto, a maior mudança constitucional do país. A população do país nesta época era de 6.000.000 habitantes. Portanto, uma parcela considerável ascende à liberdade. O dobro desta população já tinha a liberdade através das lutas de Quilombos e de outras formas como a compra de alforrias, através de leis anteriores como a do ventre livre e a dos sexagenários. Possivelmente, mais do dobro dos negros, africanos e descendentes já estavam livres no momento do 13 de maio. Isto produzia, também, um medo dos brancos poderosos de que a população negra, tanto livre como escrava produzisse uma revolução total e conjunta, depusesse os brancos do poder como tinha ocorrido a quase um século antes do Haiti.
No Brasil, as revoltas dos escravizados eram muito comuns. Os quilombos eram numerosos em todas as partes do país e os brancos proprietários viviam em clima de pavor contra possível reação da população livre escravizada. Mesmo porque, nem todos os brancos apoiavam o regime criminoso do escravismo. Pelo contrário, muitos deles se uniram aos negros para lutar contra o regime. Antes da guerra do Paraguai (terminada em 1872), o governo brasileiro usava o exército para controlar as revoltas da população negra. Foi assim que Caxias e outros militares fizeram carreira, destruindo Quilombos, eliminando revoltas populares. Mas a guerra do Paraguai trouxe nova consciência ao exército ao exército nacional. Ficou evidente que a função do exército não era defender os grandes proprietários e mantê-los no seu estado criminoso de beneficiados pelo escravismo. O exército existia para defender a nação e manter a soberania nacional, não para servir contra o povo. Depois da guerra do Paraguai o exército passou a se negar a perseguir os negros revoltosos, ficando estes casos para a polícia e os militares locais. Assim aumentou o medo branco, eles mesmos começaram a pensar na abolição como forma de evitar uma revolta maior da população negra. Entretanto, a abolição foi discutida num longo processo na sociedade brasileira. Negros ilustres como Luís Gama, Quintino de Lacerda, José do patrocínio participaram ativamente destes debates. Daí que, a Assembléia Nacional reunida no Rio de Janeiro em 1888 votou a abolição do escravismo. Decidido o fim do escravismo, o Estado brasileiro saia da situação de criminalidade contra a humanidade que se mantinha até então. Logo, em 13 de maio de 1888 a lei foi assinada. Portanto, não foi princesa nenhuma que deu liberdade aos negros. A liberdade foi uma conquista da população brasileira, uma vitória dos movimentos populares. Temos assim, uma confirmação de que governantes estavam criminosamente errados e neste dia, o erro foi abolido.
É neste sentido que a abolição foi comemorada pela população brasileira nos dias 13 e 14 de maio e deveria ser comemorada até o presente.

A lei existiu, mas não foi completa

Os poderosos capitularam, perderam, mas não se entregaram. A lei deveria ter sido votada com um amplo apoio, indenização e reintegração dos escravizados à sociedade brasileira. Entretanto, os poderosos omitiam a discussão do direito da população que tinha sido escravizada. Fizeram um esforço e conseguiram que a sociedade nunca discutisse o escravismo a luz dos valores éticos e morais. Fizeram uso dos meios de propaganda para transformar pessoas criminosas em generosas. Generosas por terem "dado" a liberdade aos negros. Isto foi e ainda é uma manipulação de informação histórica. É a omissão dos culpados pelo crime e a manipulação de informação destes por histórias deturpadas. Hoje chega a se dizer que o escravismo no Brasil foi brando, que os chamados senhores foram bondosos, que até cruzarem com os negros. Escravidão é crime, os escravistas foram criminosos, não existe nada que os isentem, a não ser o nosso esquecimento da verdade ou a nossa inconsciência produzida pela informação malévola.
A lei de 13 de maio foi incompleta, poderia ter resolvido problemas nacionais dos quais até padecemos como é o caso da reforma agrária e do aceso das populações a terra. Poderia ter promovido uma repartição da renda retornando aos ex-escravizados, através de políticas o que nos seria de direito. Visto não ter sido feito, o país até hoje sofre destes erros. Existe, portanto, mais motivos para festejarmos e realizarmos uma revisão ética da nossa verdadeira história nacional nesta data. O 13 de maio é uma revolução nas datas nacionais, é uma verdade para a população negra e brasileira. As classes escravistas foram criminosas e a humanidade deve julgá-las.

O que ocorre depois da aula do 13 de Maio nas escolas

No enfoque tradicional do 13 de maio as alunas e alunos negros vivem um pesadelo. Depois da são motivos de chacotas, gracinhas e xingamentos pelos estudantes que se acham brancos, mesmo porque a aula sobre 13 de maio costuma ser duplamente falha. O que temos é o reforço mais eloqüente de desinformações históricas e deseducativas alinhadas aos esforços dos discursos racistas. As gracinhas e piadas não são inocentes, não são coisas de crianças ou brincadeiras. Elas são manifestações de racismo e preconceitos que tiveram suporte no processo deseducativo propiciado pela sala de aula repetindo as formulações antigas e impensadas sobre o 13 de maio.
O que ocorre na aula dos educadores e educadoras desinformadas? Aqueles que não passaram por uma reflexão nova, por uma visão renovada do 13 de maio? Eles repetem as fórmulas da cultura do racismo e do preconceito. Não adianta dizer que os educadores não são racistas e preconceituosos. São sim. Façam uma revisão de consciência sobre o que elas e eles pensam sobre o negro, sobre o escravismo e sobre a África. Vejam se existe alguma coisa de positivo é um forte sinal da presença do racismo nas próprias idéias. Idéias que não são só suas, foram transmitidas continuamente nos processos do cotidiano e nos processos educacionais. Vejam o que a sociedade no senso comum repete: negro não presta, a negra fede, negro é preguiçoso. Repetem daí o que a escola também fala: o negro foi escravo, os negros vêm de tribos africanas de homens nus. São informações erradas. O que sai destes dois diálogos, o do cotidiano da rua com o da escola? Saem apenas visões negativas sobre os africanos e os descendentes destes fortalece a cultura do racismo. No 13 de maio estes discursos ficam eloqüentes, o escravo é o negro coitadinho, humilhado. Os alunos que se pensam brancos reforçam as idéias de inferioridade dos negros e aí expressam seus racismos através de piadas. Um exemplo: hei negão, se não fosse a Isabel tu estarias apanhando! Isto é racismo.
Outro aspecto que a escola não foi capaz de trazer à realidade nacional em discussão está na manutenção das idéias sobre raças e cores de pele. Não foi capaz de ver que a maioria daqueles que estão ali na sala são descendentes de africanos escravizados no Brasil. A escola não foi capaz de mostrar um horizonte mais amplo sobre a história da humanidade. História, na qual, os portugueses, mesmo antes de 1500 já tinham forte miscigenação com os africanos da mesma forma os italianos e os franceses. Não foi capaz, também de trazer para a consciência dos alunos que os europeus tinham sido escravizados muito antes da vinda para o Brasil, que houve na história da humanidade os dias em que os europeus escravizaram europeus. Por isto, de uma maneira geral todos, negros ou brancos são, de alguma maneira, descendentes de escravos. Apenas mudou o período histórico e o lugar, ou seja, os negros no Brasil entre 1532 e 1888 foram escravizados por criminosos brancos.

Henrique Cunha Júnior é professor da Universidade Federal do Ceará e colaborador do Historianet

Imagem: Litografia de Rugendas



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2 comentários:

  1. Lindo o texto muito bom para os alunos. Prof Rosí.

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  2. rsrs muito bom o texto....
    a abolição não existe, nunca existiu.... ainda continuamos vivendo em regime, um regime terrível..
    Onde negros não tem direito algum apenas de trabalhar e mesmo assim nos empregos mais desvalorizados :[ triste realidade
    ACORDAAAA BRASIL

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