domingo, 15 de julho de 2012

O LEÃO E A LEBRE E FAETONTE

O LEÃO E A LEBRE
O leão andava fazendo o maior estrago nos animais da mata. Se matasse para comer, ainda vá lá. Parece que é mesmo o destino dos mais fracos servirem de pasto aos mais fortes, mas como procedia era demais. Matava e em seguida abandonava a vítima, por isso os animais resolveram reunir-se em assembléia e depois de intermináveis discussões,dirigiram-se ao leão e disseram-lhe:
- Ó rei, propomos o seguinte a vossa majestade uma vitima tenra, que poderás devorar como entender aceita nossa proposta?
- Como não? Respondeu o Leão. Aceito.
Daquele dia em diante, nem um só dia os animais faltaram ao prometido. Antes de encerrarem as atividades diárias, lançavam a sorte e a vítima apontada pelo dedo do destino se dirigia espontaneamente, na manhã seguinte, a furna do leão que a devorava tranqüilamente. Ninguém manifestava o mais leve desgosto. Em compensação, enquanto não lhes chegava o dia da morte, iam os animais vivendo em absoluto sossego. O leão não mais os importunava, mas um dia a sorte recaiu na lebre, é verdade que a lebre já era meio velha. E, decididamente a lebre não estava disposta a morrer, pelo contrario queria continuar cada vez mais viva, pois para ela a vida valia a pena ser vivida. Chegou pois, mas de muita má vontade ao local em que rei dos animais já esperava o repasto,urrando de fome e cólera..
- Por que é que demorou tanto?
- Saiba, vossa majestade que quando vinha vindo para cá,abordou-me um enorme leão,que me obrigou a jurar-lhe que dentro de alguns minutos voltaria a sua presença. Disse-me que agora o rei dos animais é ele.
O leão não quis ouvir mais nada e perguntou á lebre, torcendo-se de raiva:
-Venha comigo, vamos ver isso agora mesmo!
A lebre então, guiou o leão até a borda de um poço bem profundo,com quase três metros de água e disse-lhe:
- Ali está ele, vossa majestade pode ver?
O leão olhou atentamente e , de fato,viu lá no fundo um leão de jubas arrepiadas e olhos fuzilantes.
O leão atirou-se dentro do poço para apanhar o seu rival e morreu afogado.
Assim , a lebre, frágil animal,mas inteligente como ela só, levou a morte o leão robusto,mas totalmente impulsivo.
AS TRÊS PENAS
Era uma vez um rei que tinha três filhas,dois deles eram inteligentes e sensatos, mas o terceiro não falava muito,era simplório e só chamado de bobalhão.
Quando o rei ficou velho e fraco começou a pensar no seu fim, não sabia qual dos filhos deveria herdar o seu reino, então ele lhes disse:
- ide-vos em viagem, e aquele que me trouxer o mais belo tapete será o meu herdeiro após a minha morte.
E para que não houvesse discussões entre eles,o rei llevou-os para frente do castelo,soprou três penas para o ar e falou.
- Para onde elas voarem para lá ireis.
A primeira voou para o oeste,a segunda para o leste, e a terceira voou reto para frente,mas não foi longe,logo caiu no chão,então um irmão partiu para a direita, o outro para a esquerda e eles zombarão do bobalhão,que teria de ficar ali mesmo,no lugar onde ela caiu.
O bobalhão sentou-se no chão, tristonho. Aí ele reparou de repente que ao lado da pena havia uma porta de alçapão.ele levantou –a, viu uma escada e desceu por ela. Então chegou a outra porta, bateu e ouviu la de dentro uma voz, chamando:
“donzela menina/ verde e pequenina
pule de lá para cá,/Ligeiro,vai olhar/quem lá na porta está”
a porta se abriu, e ele viu uma grande e gorda sapa sentada,rodeada por uma porção de sapinhos pequenos. A sapa gorda perguntou o que ele queria. Ele respondeu:
- Eu gostaria de ter o mais fino e lindo tapete.
Aí ela chamou uma sapinha jovem e disse:
“Donzela menina/ verde e pequenina,
pule de lá para cá,/ ligeiro, vai buscar/ a caixa que lá está” .
A sapa jovem trouxe uma grande caixa, e a sapa gorda abriu-a e a tirou de dentro dela um tapete tão lindo e tão lindo como não havia na superfície da terra, e o entregou ao bobalhão. Ele agradeceu e subiu de volta.
Os outros dois porém,julgavam o irmão caçula tão tolo,que achavam que ele não encontraria e nem traria nada.
- Para que vamos nos dar ao trabalho de procurar,disseram ele.
Então pegaram a primeira pastora de ovelhas que encontraram,tiram-lhe do corpo as suas mantas grosseiras e levaram-nas ao rei.
Mas na mesma hora voltou o bobalhão,trazendo o seu belo tapete. Quando o rei viu,admirou-se e disse:
- Por direito e justiça, o reino deve pertencer ao caçula..
mas os outros dois irmãos não davam sossego ao pai,dizendo, dizendo que não era possível que o bobalhão,aquém faltava juízo,se tornasse rei e pediram-lhe que exigisse mais uma condição.
- Herdará o meu reino aquele que me trouxer o anel mais belo. Ele levou os três irmãos para fora e soprou para o ar as três penas que eles deviam seguir.
Os dois mais velhos partiram de novo para oeste e leste, e para o bobalhão a pena tornou a voar em frente e a cair junto do alçapão.
Ele desceu de novo,e disse a sapa gorda que precisava do mais lindo anel. Ela mandou logo buscar a caixa,e tirou de dentro o anel que ofuscava de pedras preciosas e era tão lindo como nenhum ourives da terra seria capaz de fazer.
Os dois mais velhos zombarão do bobalhão,que queria encontrar um anel de ouro, e nem se esforçaram. Arrancaram os pregos de um velho aro de roda e levaram ao rei. Mas quando o bobalhão mostrou o seu anel de ouro, o pai disse novamente:
- o reino pertence a ele.
Mas os dois mais velhos não paravam de atormentar o rei, até que ele impôs uma terceira condição,e declarou que herdaria o reino aquele que trouxesse a jovem mais bonita. Ele soprou de novo para o ar as três penas,que voaram como das vezes anteriores.
O bobalhão desceu de novo até a sapa gorda e disse:
- Eu devo levar para casa a mulher mais bonita de todas
- Ah, - disse a sapa – a mulher mais bonita? Esta não está á mão assim de repente,mas tu vais recebê-la.
E lá deu-lhe um nabo oco, com seis camundongos atrelados nele.
Aí o bobalhão falou,bastante tristonho:
- O que é que eu vou fazer com isso?
A sapa respondeu:
- Ponha uma das minhas ratinhas pequena ai dentro.
Ele agarrou a esmo uma sapinha do grupo e colocou –a dentro do nabo amarelo; mas nem bem ela se sentou dentro,transformou-se numa lindíssima senhorita, o nabo virou carruagem e os seis camundongos, cavalos. Aí ele beijou a senhorita, atiçou os cavalos e partiu com ela, par levá-la ao rei.
Os seus irmão vieram em seguida,e não tinham feito esforço algum para encontrarem mulheres bonitas,assim levaram as primeiras campônias que encontraram. Quando o rei as viu,disse logo:
- Depois da minha morte,o reino ficará para o caçula.
Mas os mais velhos atordoaram de novo os ouvidos do rei com a sua gritaria: - não podemos permitir que o bobalhão seja rei!
E exigiram que o preferido fosse aquele cuja mulher conseguisse saltar através de um aro que pendia no salão. Eles pensavam: “As camponesas vão consegui-lo com certeza, elas são forte e robustas, mas a delicada senhorita vai se matar pulando” .
O velho rei cedeu ainda essa vez. Então as duas campônias saltaram através do aro, mas eram tão desajeitadas que caíram e quebraram seus grosseiros braços e pernas. Então saltou a linda senhorita que o bobalhão trouxera, e atravessou o aro leve como uma corça, e os protestos tiveram que cessar.
O bobalhão herdou a coroa e reinou por muito tempo com muita sabedoria, pois de bobo ele não tinha nada.


AS TRES PENAS: conto de tradição oral germânica, registrado pelos irmãos Grimm.



FAETONTE
O palácio do Sol era um lugar fulgurante. Tinha o brilho do ouro, o lampejo do marfim e a cintilação das jóias. Por dentro e por fora,tudo era resplendor e luminescência. Era sempre meio dia, e a penumbra sombria nunca vinha turvar a claridade. A escuridão eram ali desconhecidas. Poucos dentre os mortais teriam resistido por muito tempo aquela luminosidade imutável, mas também poucos tinham descoberto o caminho que levava até lá.
Não obstante, um dia ousou aproximar-se desse lugar um jovem que, de parte da mãe era mortal. Teve que parar várias vezes para esfregar os olhos ofuscados por tanta luz, mas o propósito que o trouxera até ali era tão urgente que ele se manteve firme e apressou ainda mais os passos ao entrar no palácio, atravessando as portas polidas que conduziam a sala do trono,onde estava sentada o Deus Sol,envolto por um brilho resplandecente e ofuscante. Ali o jovem parou,incapaz de dar mais um só passo.
Nada escapa aos olhos do sol, que imediatamente se deu conta da presença do jovem e para ele olhou com grande amabilidade.
- O que te trouxe aqui?
- Aqui estou para saber se és realmente meu pai, minha mãe disse que sim, mas meus amigos riem de mim,quando digo que sou seu filho. Já que em nada disso acreditam, contei tudo isso a minha mãe, e a sua resposta foi que eu viesse procurar você. Sorridente o rei Sol sorridente tirou sua coroa de luz ofuscante,para que o jovem pudesse olhá-lo sem maltratar os olhos.
- Aproximate, Faetonte! Clímenes te disse a verdade. És meu filho, espero que não duvides de minha palavra. Pretendo, dar –te uma prova de que não minto. Pede-me qualquer coisa que quiseres e serás atendido. Como testemunha da minha promessa, vou invocar o Estige, o rio do juramento dos deuses.

Sem dúvida, Faetonte, já observara muitas vezes o sol a percorrer os caminhos do céu,dizendo para si mesmo com um misto de respeito e admiração
- É meu pai que por ali passa!
Em seguida, punha-se a imaginar como seria também estar naquele carro.dirigindo os corcéis ao longo daquela vertiginosa trajetória com a finalidade de levar a Luz ao mundo. Agora depois de ouvir as palavras do pai,esse sonho louco estava prestes a se concretizar. Num instante, exclamou!
- Deixa-me, tomar o teu lugar pa! Não há coisa que eu mais queira,só por um dia! Por um único dia,deixa eu conduzir o teu carro!!
O sol então deu-se conta de sua própria loucura,porque fizera aquele juramento fatal,comprometendo-se a satisfazer qualquer desejo que passasse pela cabeça jovem e imprudente do filho?
- Meu caro menino, eis a única coisa que eu lhe teria recusado.sei que não posso fazê-lo, pois jurei pela Estije. Caso insistas, tenho que ceder,mas acho que não fará. Ouve bem os esclarecimentos do que eu tenho de fazer sobre o teu pedido. És filho meu e de Clímene. Assim, é também mortal, e a mortal algum é dado a dirigir o meu carro. Na verdade nenhum outro deus pode dirigir o meu carro, nem mesmo o rei dos deuses. Reflete sobre a trajetória que é preciso seguir,subindo a partir do mar, o caminho é tão íngreme que os cavalos mal conseguem avançar,por mais descansados que estejam pela manhã. Ao chegar a metade do percurso, a altura é tão vertiginosa que nem eu mesmo gosto de olhar para baixo, mas é muito pior a descida, e esta se precipita de tal forma que os deuses do mar, a espera da minha chegada ficam admirados ao ver que não me lanço de cabeça para baixo,guiar os cavalos também é uma luta infindável. Sua natureza de fogo vai tornando –os mais impetuosos a medida que sobem, e só com muita dificuldade consigo mantê-los sob meu controle. O que não fariam eles contigo?
Deves imaginar que lá em cima existam todas as espécies de maravilhas,cidades divinas cheias de coisas belas,mas nada disso existe. Terás de passar por feras e terríveis animais de rapina, que serão tudo o que terás para ver,o Leão,o Escorpião, o grande Câncer todos eles tentarão fazer te algum mal. E não duvides por um só instante que assim será. Olha ao teu redor e vê quantas coisas belas existem no mundo. Escolhe uma que seja o mais profundo desejo do teu coração, e ela será tua. Se desejas uma prova de que sou teu pai, que prova melhor posso te dar do que o receio pela tua vida?
Para o jovem,porém, toda a sabedoria contida nessa conversa não surtiu o menor efeito. Uma perspectiva gloriosa abria-se diante dele,que já se via orgulhosamente em pé naquele carro maravilhoso,guiando os corcéis que nem o próprio Zeus era capaz de controlar,não ligou a mínima para os perigos que seu pai lhe descrevera, não se deixou perturbar um só instante pelo medo,nem pelas dúvidas sobre sua própria capacidade. Por fim o sol desistiu de tentar convencê-lo, viu que toda a tentativa seria inútil, e, além disso, já não havia mais tempo para nada: o momento da partida aproximava-se. As portas do leste já se tingiam de seu brilho purpúreo, e a Aurora já vinha abrindo o seu caminho cheio de luz rósea. As estrelas já abandonavam o céu, e até mesmo a retardatária estrela da manhã já se apagava.

Era preciso se apressar –se mas tudo estava pronto. As estações do ano as guardiãs do Olimpo,aguardavam aguardavam o momento de abrir as portas de par em pa. Os cavalos tinham sido preparados e estavam emparelhados ao carro. Com grande jubilo e orgulho, Faetonte subiu ao mesmo e partiu. Tinha feito a sua escolha, e só lhe restava agora arcar com as conseqüências. Não que desejasse mudar alguma coisa naquela primeira corrida magnífica pelos ares. O próprio vento leste foi ultrapassado e deixado muito para trás. As velozes patas dos cavalos passavam pelas nuvens baixas, mais próximas do oceano, como se estivessem atravessando uma fina névoa marítima, e depois se elevavam rumo aos ares translúcidos das grandes alturas do céu. Durante alguns momentos de puro êxtase,Faetonte sentiu-se ao próprio Senhor do Firmamento. De repente algo se modificou, o carro começou a oscilar fortemente de um lado para o outro; a velocidade se tornou muito maior, e Faetonte percebeu que não tinha o controle de mais nada. A corrida não era mais dirigida por ele,mas pelos cavalos,eram senhores da situação, e não havia controlá-los. Saíram do caminho habitual e se lançaram para cima e para baixo,para a esquerda e para a direita. Por pouco não lançaram o carro em cima do escorpião; depois, em uma vertiginosa escalada,quase se arrebentam contra o câncer. A essa altura, o pobre condutor estava quase desmaiando de terror, e então deixou cair as rédeas.
Foi o sinal para que a corrida se tornasse ainda mais louca e avassaladora. Os cavalos voaram para o ponto mais alto do céu, e em seguida,mergulhando de cabeça para baixo,incendiaram o mundo. As mais altas montanhas foram as primeiras a queimar – Ida e Hélicon, onde vivem as musas, o parnaso e o Olimpo,que se eleva para além dos céus.através das suas encostas,as chamas desceram para os vales mais baixos e planos e para as terras cobertas de florestas escuras,até que tudo passou a ser consumido pelas chamas. As fontes evaporaram-se ,os rios foram transformados em regatos, a Líbia virou deserto e os Etíopes ficaram negros, foi aí que o Nilo fugiu e escondeu sua nascente,que até hoje continua escondida.

Faetonte,que mal conseguia manter-se no carro,foi envolto por um calor infernal e uma fumaça espessa que parecia saída de uma fornalha. A única coisa que queria agora era acabar o mais rápido possível com todo aquele tormento de terror. Teria saudado alegremente a morte; a situação também se tornou insuportável para a Mãe terra,lançou um grito avassalador que foi ecoar junto aos deuses. Estes, ao olharem lá do Olimpo para baixo, viram que a salvação do mundo dependia de uma ação muito rápida de sua parte. Zeus pegou o raio e lançou – o contra o condutor imprudente e arrependido. Faetonte caiu morto, o carro foi destroçado e os cavalos enlouquecidos foram lançados foram lançados nas profundezas do mar.
Através dos ares,Faetonte caiu como uma bola de fogo sobre a terra. O misterioso rio Erídano, nunca visto por qualquer mortal,recebeu,os e os extinguiu o fogo e esfriou-lhe o corpo. Náiades,com pena de velo morrer tão jovem e cheio de coragem,sepultaram-no e gravaram em seu túmulo:
Aqui jaz Faetonte, que dirigiu o carro do Deus- Sol.
Foi grande o seu fracasso,mas grande também sua ousadia.


Origem: Faetonte,conto de aventura da mitologia grega.
Escrita por Ovídio poeta italiano.

O CERCO DA LAPA

A semente da idéia republicana, há tanto acalentada, de forma tumultuosa, transformara – se em realidade com a Proclamação feita no dia 15 de novembro de 1889. O improviso, porém, a falta de preparo psicológico do povo, as aspirações diversificadas da massa fizeram com que a medida não fosse recebida por muitos como “a esperada árvore da redenção nacional”. Os descontentamentos deram origem a uma crise que, enfim, provocou o afastamento de Deodoro, da Presidência, substituído por Floriano. Mas a renúncia não significava a paz: em julho de 93, o Almirante Wandenkolk parte de Buenos Aires e, apossando – se do navio Júpiter, transforma – o em um vaso de guerra, rumando para o porto do Rio Grande, onde pretende estabelecer a base de operações da revolução. Wandenkolk fracassa e é preso, mas o grito de revolta está dado. Quando parecia esmagado o germe da subversão, Custódio de mello, Ministro da Marinha, abandona a Pasta e empunha o estandarte revolucionário. De posse da Esquadra e com o apoio de Saldanha da Gama, passa a hostilizar o governo. No Rio Grande do Sul, é formado o exercito Libertador, uma coluna de dez mil homens, fortemente armados. A 1ª expedição enviada por Floriano é batida, em Bagé e, de súbito, o Estado de Santa Catarina está em mãos dos rebeldes. A capital – Desterro – é transformada em sede do Governo Revolucionário e o Paraná é a próxima etapa dos maragatos. Era preciso dete- Los ali, até que Floriano organizasse a reação. Foi nesse clima que uma pequenina cidade – a Lapa – ponto natural de passagem das tropas gaúchas, transformou – se na última trincheira da República. Esta é a história da heróica resistência cujo 75º aniversário é agora comemorado.

A missão confiada por Floriano ao Coronel Gomes Carneiro era impedir a marcha dos rebeldes.



De Curitiba á Lapa, cinqüenta e sete quilômetros, por rodovia asfaltada. Já a distância ela é avistada no meio do vale, onde o chapadão do Monge e o Morro da Cruz são pontos dominantes. Com duzentos anos de existência, a Lapa tem suas origens no ciclo do tropeirismo, quando os comboios de gado procedentes de Vacaria, no Rio Grande do Sul, eram levados ao mercado de Sorocaba, em São Paulo. A longa viagem exigia inúmeras interrupções para descanso dos tropeiros e, assim, nasceram as “pousadas”, que se transformariam em cidades. Meio caminho entre Rio Negro e Curitiba, a Lapa era, então, a Vila Nova do Príncipe. Depois transformou – se em centro ervateiro, quando o Paraná fez do mate a sua economia básica. O seu aspecto ainda hoje evoca – nas casas de estilo colonial português – o fim do século passado. As ruas estreitas, calçadas de pedra, poderiam conservar as designações de outrora : Rua das Tropas, Rua da Boa Vista, Rua do Cotovelo, Rua da Cachaça. Na praça principal, a igrejinha de Santo Antônio; á sua esquerda, a residência do Coronel Joaquim Lacerda; não muito distante, o “congresso Recreativo; clube fundado pelo juiz Amintas da Costa Barros.

Assim é a Lapa de hoje.
Assim era a Lapa dos fins do Século XlX.

Já passava das duas da tarde do dia 31 de outubro quando o General Francisco de Paula Argolo, recém – nomeado Comandante do 5º Distrito Militar, á frente de uma força expedicionária composta de vinte e seis oficiais e quatrocentos e trinta e seis praças, chegou á Lapa. Mal entrou na cidade, Joaquim Lacerda, o rico chefe político local, foi ao seu encontro, com os sessenta homens que conseguira recrutar ás pressas. Era o ano de 1893 e todo o Sul vinha sendo varrido pelo vento da revolução federalistas. Vestidos em suas bombachas e palas, lenços coloridos ao pescoço, os gaúchos comandados por Gumercindo Saraiva, um caudilho que se criara no Uruguai, marchavam, com decisão, rumo ao Rio de Janeiro. O objetivo era um só : depor Floriano da Presidência da República e amarrar os cavalos no Itamarati.

Desde que entrara em território brasileiro, no começo do ano, com uma pequena coluna, Gumercindo somara sucessos, ganhara adesões. Primeiro, bate – se em salsinho e no Minuano. Depois, luta em D. Pedrito e Santana. Vence, em Bagé, a expedição de Floriano. De repente, os rebeldes são dez mil. Ao lado de Gumercindo, outros chefes despontam: seu irmão Aparício, mais Laurentino Pinto, Juca Tigre, Torquato Severo. Afinal, entram em Santa Catarina e a Capital – Desterro – tomada pelos revolucionário, é transformada em sede do Governo dos maragatos, nome pelo qual são conhecidos os rebeldes.


Foi só nos primeiros dias de outubro que Floriano, ante a ameaça da invasão iminente, decide adotar providencias que cortem a investida. O General Argolo é nomeado para o comando do 5º Distrito Militar, no Paraná. Em sua companhia embarca apenas a oficialidade. A viagem foi lenta: deixando o Rio no dia 3 de outubro, eles chegam a São Paulo no dia seguinte e decidem prosseguir pelo Varadouro, que oferecia maior segurança. Só no dia 10 chegam a São Vicente, de onde continuam, para Itanhaém. Cinco dias depois, passam por Cananéia e, enfim, a 17, alcançam os rebocadores de Paranaguá. No dia seguinte, Argolo assume o comando do Distrito e de todas as forças em operação no Paraná, permanecendo em Curitiba até o dia 30, organizando a força expedicionária. Os recursos não são muitos. Aos oficiais vindos do Rio juntam – se os Tenentes Mário Tourinho, José Pamplona, enquanto é reunida uma pequena coluna composta de uma bateria de artilharia de canhões Krupp 7,5, um piquete de trinta praças de cavalaria, e mais cento e poucas praças do 17º Regimento de Infantaria e o Regimento de Segurança do Paraná, sob o comando do Coronel Dulcídio Pereira. Ao todo, não chegam a quinhentos homens.

--Até que enfim o senhor chegou – exclamou o Coronel Lacerda, quando Argolo entrou na cidade.
Do Rio para o Sul, o país estava convulsionado: enquanto na baía da Guanabara explode o paiol de pólvora do Matoso, na capital catarinense as famílias são impedidas de deixar a cidade. Mais abaixo, as forças rebeldes, sob o comando do Coronel Salgado, chegam a Tubarão e partem para laguna.
A intenção imediata do General Argolo é atacar os revolucionários. Com essa disposição, ele entra em Santa Catarina. Depois de passar por Rio Negro, chega a São Bento, dia 10 de novembro, e lança uma proclamação, assumindo o governo catarinense. Três dias depois, entretanto, a coluna rebelde comandada por Piragibe vem em seu encalço . Enquanto isso, de Joinville, Gumercindo Saraiva, com dois mil homens, prepara a marcha sobre Curitiba, passando pela Lapa. Temendo um envolvimento, Argolo começa a retroceder. No Rio, Floriano declara que “se sente forte, mas que uma esquadra não se improvisa”. Com os navios sob o controle de Custódio de Mello, o Marechal aguardava febrilmente a chegada de outros, encomendados no exterior.
O quarto aniversário da Proclamação da República ocorreu quando Argolo e seus homens estavam acampados em Rio Negro. Da Lapa, o Coronel Lacerda lhe envia mais quatrocentos voluntários, deixando apenas cem na cidade. Mas Piragibe e seus gaúchos o perseguem e o General recua.
A ordem transmitida a Argolo por Floriano foi lacônica: “Pare onde estiver e aguarde ordens”.

O Coronel Antônio Ernesto Gomes Carneiro se encontrava no Largo do Machado, no Rio, quando o ordenança lhe entregou o ofício. Naquele dia, ele completava quarenta e sete anos .nascido na cidade mineira do Sêrro, o pai
- Marciano - queria que o filho seguisse a sua profissão: farmacêutico. Mas as fardas vistosas da Guarda Nacional faziam o menino sonhar com outro destino: “quero ser General”. A oportunidade para o ingresso na carreira militar veio em 1865. Deflagrada a Guerra do Paraguai.



Missão de gomes carneiro era salvar a república

Gomes Carneiro foi dos primeiros a se alistar. E a 2 de janeiro daquele ano, no posto de anspençada, ele partiu com o primeiro núcleo para o Rio Grande. Cinco anos depois, ele não era mais um recruta voluntário e sim um veterano, que fazia parte do exercito efetivo por seus atos de bravura. Ocupava a chefia da Comissão de Linhas Telegráficas, que estava operando em Mato Grosso e já era Major, quando a República foi proclamada. Em vista da abertura de uma vaga de Tenente - Coronel, Floriano propõe seu nome a Deodoro para a promoção, mas o Presidente recusa, alegando que ele ficara alheio aos republicanos na questão militar. Floriano responde a Deodoro com um bilhete: “Maneco, o Carneiro é oficial de pena e espada, mais republicano do que eu e você e, se não esteve conosco na questão militar, foi por Ter sentimento e caráter. Hoje, afirmo que ninguém é mais republicano que ele e se algum dia a República precisar, em suas mão estará salva”.

Era esse homem que Floriano chamava ás pressas ao seu gabinete, naquela tarde de 18 de novembro de 1893, precisamente para confiar a missão de salvar a República. Mal tomou conhecimento da convocação, Carneiro se dirigiu ao Itamarati. O Marechal fechou as janelas para que o tiroteio não perturbasse a conversa, e lhe expôs o quadro sombrio. Por fim, pediu – lhe que fosse substituir Argolo. Num último apelo, acrescentou:
---- Não me negue esse serviço.

O Coronel Carneiro solicitou um mapa, a fim de traçar um plano, mas Floriano replicou:
----- Não, meu caro; você vai com carta branca. Faça o que quiser, obedecendo apenas esta determinação geral: não os deixe passar.
E após uma breve pausa, acrescentou:
------Você conta com a pouca gente que o Argolo conseguiu, mais os recrutas de um tal Lacerda e os patriotas de São Paulo, que espero mandar.
Apertando a mão do Marechal, Carneiro pediu apenas quarenta e oito homens para partir e despediu – se :
--------- Marechal, Vossa Excelência confiou em mim. Eu lhe afirmo, sobre os galões do meu punho, que a coluna inimiga não passará.

Acompanhado apenas pelo Tenente – Coronel Pereira da Cunha, Gomes Carneiro passou por São Paulo no dia 20 de Novembro, ao mesmo tempo que, da cidade catarinense de Curitibano, Gumercindo Saraiva partia para Blumenau. De São Paulo até Tatuí, o Coronel Carneiro viajou de trem. Dali para a frente, entretanto, teria que prosseguir a cavalo. Em dois dias, a galope, foram vencidas as primeiras trinta e três léguas. Depois, já em território paranaense, a marcha se torna mais morosa, em face de dificuldade de substituição dos animais. Ainda assim, em quatro dias e meio, ele percorre as quarenta e uma léguas restantes. Era 25 de Novembro quando ele chegou na Lapa. Dois dias depois, o General Argolo lhe passa o comando das tropas. Um bando de homens abatidos, exaustos, sem moral. Em carta á esposa, Carneiro confessa: “Condeno Argolo por Ter deixado que está gente toda enfraquecesse pela desconfiança e pela inércia, gente boa que ele comandou sem capacidade e sem bravura”.
O “tal “ Lacerda, a que se referia Floriano, impressionou Carneiro no primeiro contato, pelo arrojo, coragem pessoal e falta de respeito ás etiquetas. Além da força de seiscentos e cinqüenta homens recrutados por Lacerda, com integrantes do 15 de Novembro, sob o comando de João Ramalho, do 13º de Cavalaria da Guarda Nacional, sob o comando do Coronel João Pacheco dos Santos Lima e do 18º de infantaria da Guarda Nacional, comandados pelo Tenente – Coronel Aristides Vilas Boas, conseguira com esforço mais trezentos e poucos homens em dois batalhões: o Floriano Peixoto, sob o comando do Dr. José Amintas da Costa Barros, e o da reserva da guarda Nacional, liderado por João Domingues Garcia. Ao todo, mil e trinta e seis homens.
Carneiro procurou verificar também o material bélico de que dispunha. Havia absoluta heterogeneidade: fuzis Miniet, Tower e outros de tipo arcaico, como chasssepot e comblaim, de tiro único, até modernos modelos americanos – Marlin e Spencer. Os rebeldes, se também tinham armas heterôgeneas, possuiam, entretanto, em sua artilharia o que havia de melhor : canhões Krupp 7,5mm, Witworth, um pequeno La Hitte e duas metralhadoras Nordenfeld. Mais do que isso, eles eram milhares.
A principal preocupação do Coronel Carneiro era não perder tempo. No dia 6 de Dezembro, ele decide experimentar sua gente, ordenando os primeiros reconhecimentos. As forças de Piragibe haviam penetrado até as proximidades da Lapa e uma grossa coluna acampara na Roseira. Foi nos últimos dias de Dezembro que Carneiro determinou um avanço sobre o rio da Várzea. Durante horas houve tiroteio com os rebeldes, que afinal, com grandes perdas, retiraram – se. Mas os pequenos combates se sucedem.
Janeiro começava. O Coronel Jacques Ouriques, reunido com outros chefes revolucionários em São Francisco, Santa Catarina, apontou o mapa aberto sobre a mesa e expôs o plano de ação.
------ O inimigo tem seus redutos na Lapa, em Ambrósio e Paranaguá. A caminho da Lapa está o General Piragibe e , com ele, Torquato Severo e Juca Tigre. O Augusto Amaral se dirige para Ambrósio, vigiando os preparativos de uma entrada de rodagem por onde os legistas pensam passar com a artilharia para nos atacar. A notícia que temos é que a guarnição de Ambrósio é de apenas trezentos homens, força muito pequena para fechar uma porta tão importante. Por algum tempo, os chefes rebeldes debateram o projeto de Jcques Ourique, para, enfim, aceita – lo integralmente: em ato simultâneo, seriam atacados os principais pontos de resistência legalista: Paranaguá, Tijucas e Lapa.

Dia 11 de janeiro, ao mesmo tempo que ocorre um levante em Paranaguá, Gumercindo Saraiva, com mil e oitocentos homens, ataca os duzentos legalistas que defendem Tijucas. Pouco depois, o General Piragibe acampa em Roseira, entre Rio Negro e a Lapa, com mil e duzentos homens. Paranaguá, por sua vez, sofre um ataque da esquadra e cai em poder dos revoltosos. No dia 16, Piragibe comanda o primeiro ataque á Lapa. As guardas postadas no Alto do Monge, no Boqueirão e no Capivari são obrigados a voltar á cidade. Carneiro determina que sejam feitas fortificações provisórias e erguem – se as primeiras trincheiras --- sacos de terras amparados em pranchões. No dia imediato, os federalistas iniciam o cerco. Ao mesmo tempo que Aparicio Saraiva, irmão de Gumercindo, ocupava a estação da estrada de ferro, as forças sob o comando de Torquato Severo e Laurentino Pinto sitiavam as outras três faces. Fora da cidade, a noroeste, Gumercindo estabelecera o seu Quartel – General.

Mas até o dia 21 de janeiro, o fogo fora quase nulo. Pessoalmente, Carneiro percorria as linhas de frente, estimulando os soldados. Foi no dia seguinte que houve o ataque esperado: dois mil homens se lançaram contra os legalistas e conquistaram o Cemitério e o Engenho Lacerda. A resistência passou a ser feita das trincheiras. Ás seis da tarde cessou o fogo. Ao todo, os republicanos haviam perdido vinte e quatro homens.

Os dias 23 e 24 foram de bombardeio. Os quatro canhões Krupp dos revoltosos atingiam as residências, perfurando – as. A queda de Curitiba, Paranaguá e Ambrósios provoca uma onda de intrigas na Lapa, não faltam os que proponham a caapitulação. Começam as deserções entre os patriotas e na Guarda Nacional, mas Carneiro não desiste. Numa última tentativa de estimulo, faz divulgar a notícia de que reforços comandados por Pinheiro Machado se dirigem á Lapa. O bombardeio, porém, recrudesce e o tiroteio de trincheiras se torna freqüente. Mas Carneiro, a cada dia que passa, conquista uma vitória parcial: a luta contra o tempo, retendo o inimigo.
A Rua das Tropas e o Alto da Lapa, posições mantidas por soldados do 17º Regimento e lll Batalhão até a noite de 26 de janeiro, são ocupadas pelos sitiantes, que dali passam a metralhar com maior eficiência.

Os combates se transformam em caçadas humanas. Do Cemitério, um canhão federalista varria toda a rua da Boa Vista.
Quando janeiro chega ao fim, a água e a comida se tornam reduzidas. Como os ataques diurnos não surtissem o efeito esperado pelos rebeldes, eles decidiram atacar á noite. Eram onze horas do dia 2 de fevereiro e apenas as sentinelas estavam acordadas quando houve a investida. Acordados ás pressas pela corneta de ré, os oficiais de artilharia do Largo da Cadeia armam seus canhões com lanternetas e começam o fogo. Durante toda a manhã do dia 3 o canhão do cemitério bombardeou a cidade. Na Rua da Boa Vista, na Praça da Matriz, nas ruas do Cotovelo e da Cachaça, várias casas haviam ruído. Pelas ruas, junto ás trincheiras, as poças de sangue atestavam a violência dos combates. Mas foi só na noite de 6 para 7 de fevereirro que rebeldes tentaram novo ataque, protegidos pela escuridão. Entrando pelos quintais, sem chamar a atenção, ocupam as casas da Rua da Boa Vista. Como sempre, ás seis horas da manhã, os dois canhões dos federalistas ----- o do Cemitério e o do Boqueirão – dão sinal de combate. Enquanto há cerrada fuzilaria, os revolucionários fazem o ataque geral, com dois mil homens. Carneiro manda sustentar o fogo e percorre as trincheiras. Também o Coronel Lacerda faz o mesmo. O Coronel Dulcídio, ao descer do seu posto de observação, é ferido mortalmente.
Eram oito horas da manhã quando as janelas da casa de Francisco de Paula, na Rua da Boa Vista, se abrem repentinamente e dezenas de federalistas descarregam os fuzis sobre a trincheira da esquina. Carneiro ordena que recuem para a Farmácia Westfalen, mas nesse momento o Tenente Henrique dos Santos é atingido no peito. O Coronel Carneiro corre em seu socorro, quando uma bala de Comblain o atinge no estômago e no fígado. Amparado no braço do Tenente – Coronel Blum, é levado para a casa de Pedro Fortunato, onde o médico João Cândido Ferreira instalara o Hospital de Sangue Joaquim Lacerda e Líbero Guimarães acompanham o chefe militar. Carneiro tenta dissimular a gravidade do ferimento, dirigindo – se ao médico:
------ doutor, venha examinar – me. A bala não penetrou, contundiu – me, apenas. Qualquer que seja, porém, a gravidade, o doutor dirá a todos que é leve e que muito breve estarei ao lado de meus companheiros.
Quando cessa o tiroteio, chega a noticia da morte de Amintas da Costa Barros, atingido por um tiro de fuzil na cabeça. Serra Martins vai visitar Carneiro, a fim de receber as ordens, e do seu leito o Coronel replica:
-------- A ordem é uma só: resistência, resistência a todo transe.
Eram quatro horas da tarde do dia 9 de fevereiro quando Carneiro, já sem forças, insiste em agradecer a atenção que lhe é dispensada. Voltando – se no leito, diz á esposa do médico João Cândido: ----- Seu marido me livrou desta; agora não morro.
Alguns minutos depois, ele falecia.

Durante vinte e seis dias, com uma pequena força, ele resistira na cidade sitiada. Era o tempo de que necessitava o Marechal Floriano. Carneiro morria com a missão cumprida: a República fora salva.


Texto tirado do livro didático de história – 2010.

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